É bem verdade que um dia virá em que , não diria que não seja necessário consagrar um determinado tempo à oração, essa adesão íntima à oração do Espírito de Cristo será em nós uma realidade sempre atual, viva e ininterrupta. As nossas ocupações á não a perturbarão mais. O impulso do Espírito, então, transporta-nos e anima-nos, que estejamos a caminhar, ou a trabalhar ou a falar. Ou até mesmo a dormir: “Eu durmo mas o meu coração esta desperto” exclama a esposa do Cântico dos Cânticos. Essa é a oração contínua que Cristo recomenda aos seus discípulos: “É preciso orar sempre” (Lc 18,1); recomendação que S Paulo transmitia aos Tessalomicenses: “Andai sempre alegres, rezai sem cessar, e, em todas as circunstâncias, daí graças a Deus” (1 Tes 5,16-18) (PD 111).

Morar na oração. Viver na oração. Acolher a oração como um rio subterrâneo, cujo murmúrio aflora sem cessar a nossa consciência. Não poderemos lá chegar pelas nossas próprias forças. A oração contínua. Mas podemos desejá-la e pedi-la. E, sobretudo, preparar-lhe o terreno. Como? Exercitando-nos na oração freqüente.

Para isso, é preciso pensar em Deus durante o nosso dia. Ou, segundo a expressão dos salmos, é preciso “lembrar-nos de Deus”. Quando amamos alguém, o nosso pensamento voa muitas vezes para essa pessoa. Lembramo-nos do nosso último encontro. Esperamos o seguinte. Recordamos nós próprios as perfeições do ser amado. Procuramos o que lhe possa dar prazer… Perguntem aos apaixonados…

Melhor ainda que pensar em deus, é falar com Ele. Nessa altura, já não é para nós um “Ele”, mas torna-se um “Tu”, com quem entramos numa relação pessoal. O ser amado de quem falamos um pouco antes pode estar ausente. Deus está sempre presente em nós, “mais íntimo de nós, do que nós mesmos”, como diz Santo Agostinho. Basta entrar em nós mesmos com fé para O encontrar. E para nos tornar atentos à Sua presença, manter os nossos sentimentos por Ele, mas também dos Seus desígnios sobre o mundo, da Sua vontade sobre nós. E como o nosso Deus é um Deus vivo e em três Pessoas, podemos dirigir-nos alternadamente ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.

O Padre Caffarel cita-nos este conselho de um vigário a um jovem que queria aprender a orar: “É verdade! Queres aprender a orar? Pois bem, François, vai à capela, e lá fala com Ele”. E o rapaz comentava: O conselho do vigário só era banal em aparência. Para dizer a verdade, ele revelava-se como experiente homem de oração que, em vez de um longo discurso, se contentou em responder ao jovem desejoso de aprender a orar com estas três simples palavras: “Fala com Ele”. Ninguém conversa com uma sombra. É necessário, portanto, tomar consciência da presença de Deus para Lhe falar. E para saber o que Lhe dizer, é preciso que a fé desperte e procure. E a obrigação de formular palavras leva-nos a não nos contentar com impressões inconsistentes, obriga-nos a exprimir pensamentos, vontades, sentimentos precisos. De fato, são grandes os méritos de um tal método – se é que se pode chamar método a um conselho tão simples (PC 14).

O meio concreto de falar com Deus é utilizar a própria Palavra de Deus. Encontramos na Bíblia o suficiente para formar uma reserva de invocações que nos podem servir de “bóias”, que nos mantenham, na intimidade com Deus, acima das nossas preocupações diárias. Podemos guardar frases como: “Ó Senhor nosso Deus, como é grande o Teu nome em todo o Universo” (Sl 8,2). “A minha alma tem sede de Ti, meu Deus” (Sl 42,2). “O Senhor fez por mim maravilhas, santo é Seu nome” (Lc 1,42), etc. Estas fórmulas podem também ser cantadas interiormente, ou até mesmo em voz alta se estamos sós.

Temos ainda um outro meio: são os freqüentes “mergulhos” em nós próprios para nos aproximarmos de Deus que ali habita. Um humilde frade convertido do Séc. XVII, Laurent de la Réssurrection, que tinha atingido uma alta vida espiritual, gosava de dizer áqueles que vinham consultá-lo que não há meio mais eficaz para chegar com segurança a uma vida de oração contínua e, em seguida a uma grande santidade, do que ser fiel a essa prática. Escutemos as suas palavras: “Durante o nosso trabalho e outras ações, mesmo durante as nossas leituras e escritos, mesmo espirituais, e até mesmo durante as nossas devoções exteriores e orações vocais, devemos parar por breves momentos, o mais freqüentemente possível, para adorar Deus no fundo do nosso coração e saboreá-Lo ainda que de passagem e como que furtivamente.” (PD 13).

Uma prática muito importante no Oriente cristão, “a oração de Jesus”, pode também ajudar-nos. É uma invocação centrada no nome de Jesus e que geralmente consiste nestas palavras: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus Salvador tem piedade de mim, pecador.” Essa fórmula pode ser abreviada em “Senhor Jesus tem piedade de mim.” Os mestres espirituais orientais incitam a repeti-la sem cessar. E até mesmo seguindo o ritmo da nossa respiração. Inspirando, devemos dizer: “Senhor Jesus” e expirando: “Tem piedade de mim.” Assim estaremos associando o nosso corpo à oração, que se tornará tão natural como a respiração. A sua eficácia espiritual vem da invocação do nome de Jesus. Para os Orientais – mais próximos do que nós da tradição bíblica – o nome não é uma simples etiqueta colocada sobre o indivíduo, mas é a própria pessoa. Jesus, em hebraico, significa “Deus salva”. Invocando o nome de Jesus, estamos chamando o próprio Jesus com todo o Seu poder de salvação: “Não existe sob o céu qualquer outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (Act 4,12).

Dedicando-nos à oração freqüente ao longo dos nossos dias, pode ser que cheguemos um dia, pela graça de Deus, à oração contínua. Para aqueles que chegam a essa oração interior e contínua, a oração do Espírito Santo já não é uma simples brasa sob a cinza, mas uma chama que toma conta de todo o ser. Um santo é uma oração viva (PD 112).